segunda-feira, 5 de março de 2012


A IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA DO DIREITO


Josélia Cristina Gomes Santos*

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*Aluna do 9º período do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão – UFMA. CAMPUS II, IMPERATRIZ-MA.


RESUMO: O presente trabalho busca evidenciar a importância da Filosofia do Direito, demonstrando a sua efetiva participação para o aprimoramento do saber jurídico a partir do desenvolvimento de um pensamento crítico, da inquietação e questionamento do direito posto, e provocação da dialética no campo da ciência do direito, fundamentos para a conscientização das mudanças necessárias, e conseqüente evolução e modificações positivas no sistema jurídico, e na vida em sociedade.

PALAVRAS-CHAVE: Direito. Filosofia do Direito. Reflexão. Importância.

  1. INTRODUÇÃO

Durante o curso de Direito, não é incomum o questionamento sobre a importância do estudo de determinados saberes. Assim, com o surgimento dessa indagação quanto ao estudo da Filosofia do Direito, procuramos nesse trabalho, evidenciar que, apesar da subjetividade que é característica da filosofia, a sua contribuição é relevante para se pensar o Direito, e para uma atuação mais eficiente no mundo, a partir do modo filosófico de pensar do Direito.
O objetivo desse trabalho é uma breve reflexão sobre o exercício do Direito enquanto ciência instrumental, o que seria ele sem a filosofia e até onde  ela contribui para o seu efetivo conhecimento e utilização.

2.  CONSIDERAÇÕES ACERCA DA FILOSOFIA DO DIREITO.

            Definir a Filosofia do Direito é uma árdua tarefa, uma vez que não há uma definição posta, preconcebida. É necessária uma profunda reflexão sobre todos os aspectos que a envolvem, e; sendo ela, uma vertente da filosofia, também padece das mesmas dificuldades.
“A Filosofia pretende apreender seus objetos de estudo de forma totalizante e o mais universal possíveis.”[1] Dessa maneira, “questionar, problematizar, criticar, rever, rediscutir, são verbos que dominam a inquietação incessante do filósofo.”[2]
Nesse sentido, BITTAR, et al, 2010, descreve a Filosofia do Direito como um saber crítico a respeito das construções jurídicas erigidas pela Ciência do Direito e pela própria práxis do Direito. E define como sua tarefa, buscar os fundamentos do Direito, seja para cientificar-se de sua natureza, seja para criticar o assento sobre o qual se fundam as estruturas do raciocínio jurídico, provocando, por vezes, fissuras no edifício que por sobre as mesmas se ergue.[3]
E prossegue, em uma comparação diferencial entre a ciência do Direito e a própria Filosofia do direito, onde afirma a independência e superioridade da filosofia, nas palavras que transcrevemos a seguir:

“Não se confundindo com as práticas científicas do direito, é-lhes superior, não qualitativamente, mas pelo fato de pairar para além da visão que possuem do fenômeno jurídico. As ciências jurídicas partem da norma para seus resultados aplicativos e/ou conseqüências; a especulação filosófica volve da norma a seus princípios, a suas causas, a sua utilidade social, a suas necessidades, a suas deficiências... de qualquer forma, possui comprometimentos com a história, com a ideologia, com a sociedade, com a política..., destacando-se por suas preocupações universais e não setoriais.”[4]

Assim, percebemos que a Filosofia do Direito, apesar da sua independência científica, não pode estar dissociada do Direito, enquanto ciência, pertencendo a ela a própria origem do Direito, e constituindo-se em uma das bases fundamentais da evolução e do conhecimento do Direito.

3. A INSERÇÃO DA FILOSOFIA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

Ao contrário do que se possa imaginar, a filosofia, apesar de muitas vezes ficar relegada a um segundo plano, é de primordial importância para o exercício da cidadania, com ênfase especial, no caso específico dos juristas, uma vez que o direito é quem dita as normas de controle da sociedade, logo, precisa ser pensado e repensado, bebendo em fontes analisadas à luz do pensamento filosófico, não devendo prender-se a técnicas e dogmas vazios de essência, limitados.
“O pensamento-filosófico está enraizado no processo histórico-social e reflete, inevitavelmente, os conflitos dos valores e dos interesses hegemônicos com os das parcelas dominadas da sociedade.”[5] Nesse sentido, inegável a sua importância, pois, torna possível a reflexão crítica acerca dos valores e interesses dominantes, e abre pressupostos a mudanças, uma vez que promove, de modo geral, um profundo questionamento da existência, que não podem ser resolvidos com mera aplicação da lógica.
Assim, ressaltamos a concepção de Alaôr Caffé Alves, que considera que o saber filosófico é diferente do saber científico. No seu entender, a ciência basicamente tem sua apuração calcada na perspectiva da observação e da experiência, e deve permanecer nos limites do empírico. Já a filosofia parte da experiência; mas transcende a experiência, vai além da experiência singular.[6]
“A Filosofia, expressão da autoconsciência, está condicionada não só pelo passado, mas também pela vida do presente, pelo modo como se produz ou se reproduz a vida social e material no presente.”[7]
Segundo Celso Lafer, uma das características da Filosofia do Direito como campo de investigação é o aprofundamento da metodologia da interpretação. Considera o autor que, os grandes temas da Filosofia do Direito aparecem na experiência jurídica e, especialmente, nos dias atuais, na reflexão sobre a interpretação, quando se discutem os princípios gerais.[8] Para esse autor, os problemas que surgem da aplicação dos princípios gerais do direito, não podem ser resolvidos com base em uma visão estrita do ordenamento jurídico, sendo necessário que estes sejam analisados tanto internamente, no campo normativo e da sua inserção no ordenamento, e, externamente, considerando-se os fatos e os valores que exigem ponderação.
            Os tempos modernos nos induzem a agir, muitas vezes, automaticamente, sem refletir, baseados em comportamentos já pré-estabelecidos, onde, o grande problema acaba sendo a forma de ajuste a regras postas. Não paramos pra questionar o cabimento, a real pertinência daquilo à necessidade que se busca atender, ou mesmo a adequação da solução possibilitada em escala. Nos tornamos, pouco a pouco escravizados por um sem número de regras e protocolos operacionais, dominados pelo sistema, perdendo mesmo o alcance do sentido daquilo que buscamos, e, por isso, perdemos autonomia, conforme se denota das palavras de BITTAR, E. C. B. et al. 2010:

          “Não há autonomia sem capacidade de reflexão. Nossos tempos, pós-modernos, são tempos de profunda apatia intelectual, de aestesia da consciência coletiva, de desmobilização ideológico-política, de falência das estruturas institucionais, de derrocada de paradigmas do Direito e de justiça. Em tudo, predomina a força do mercado. Tudo é pensado a partir do mercado. [...]. Apesar da necessidade mais do que urgente de se pensar, sob estas condições, é-se, ao mesmo tempo, impedido de pensar.”[9]
        
Para BITTAR, E. C. B. et al. 2010, Apesar da impressão do aumento de liberdade, o homem pós-moderno, vive o paradoxo do adensamento da opressão e da fragilidade pessoal.
O interdito ao pensamento vigora em todos os meios, mesmo nos meandros da educação de mercado, pois se o pensamento significa autonomia, ele incomoda, ele provoca, ele modifica, ele desestabiliza, ele causa distúrbios e produz a perda de hegemonias.[10]
Portanto, é exatamente nesse momento que a filosofia se mostra ainda mais importante. É essencial que não se perca a capacidade de reflexão, pois é esta capacidade que nos dá autonomia, e nos torna capazes de atuar interativamente na sociedade, e, através do olhar crítico, buscar a participação nas modificações necessárias.
                                   
4. PRA QUÊ FILOSOFIA DO DIREITO?

“Ao pensar na Filosofia do Direito, tenho que refletir até que ponto o Direito não tem determinada função exatamente para manter as coisas como estão, exatamente para manter e consagrar ideologicamente as linhas de preservação disso que está aí.”[11]
A filosofia do direito é a porta de reflexão sobre esses aspectos subjetivos do direito, que permite uma análise desvinculada dos limites da técnica jurídica, que podem sondar a essência do que move os instrumentos políticos, e conduz os rumos sociais.
SILVA JUNIOR, A. S. R. 2012, a partir dos questionamentos abaixo, busca evidenciar que o saber filosófico pode ser um poderoso instrumento a serviço do labor dos juristas.
“Como não percebemos aplicabilidade direta dos conhecimentos adquiridos no curso de Filosofia, tendemos a negar-lhe importância. Conseqüentemente, é inevitável que se qualifique de inútil o saber filosófico. Todavia, o que é útil em si mesmo? A que se refere a utilidade de algo? ao fato deste algo ser um fim em si mesmo ou ser meio para outras finalidades?”[12]

Sendo um meio para se atingir o ideal da ciência do direito, mesmo não tendo uma utilidade direta, a Filosofia do Direito é imprescindível para a existência e a evolução do direito, pois tudo parte do pensamento, da idéia, que é o objeto fundamental da filosofia.
Nesse sentido, transcrevemos abaixo as considerações de BITTAR, E. C. B. 2010, acerca da influência da filosofia nas mudanças:

Seria demasiado exagero considerar que é pretensão dos filósofos modificarem o mundo. Suas idéias, porém, não se lançam ao mundo sem motivos, sem objetivos, sem finalidades. O pensamento se exerce de forma tão presencial entre os homens do mundo que, uma vez acolhidas e adotadas como forma de comportamento trazem como desencadeamento de certa modificação do mundo, então, o filósofo modifica indiretamente o mundo, pois seu rastro é sua marca impressa sobre as coisas e as pessoas, à medida que suas idéias são recepcionadas, dispersas, divulgadas pelas comunidades a que se destinam. Essa modificação decorre do fato de as pessoas abraçarem a palavra apregoada na seara da filosofia, de modo a criar-se, na prática, o que no pensamento foi arquitetado pelo pensador. [...].[13]

A filosofia cria e recria, pois na inquietude das idéias, vão surgindo novas idéias, assim, a constante crítica à realidade, é que propulsiona as mudanças. Eis o diferencial da filosofia do direito: “A visão filosófica nos permite visualizar a visão permanente entre direito ideal e direito real.”[14]
“Quando explicamos, não dizemos como as coisas devem ser, mas como são.
Explicações são absolutamente insuficientes para revelar o Mundo Ético. Para conhecer o Mundo Ético, o Mundo Moral, o mundo do comportamento humano, é preciso compreendê-lo.”[15] E essa compreensão é atingida no campo da filosofia do direito.
            “O Direito, quando reduzido a uma simples técnica, fica desbussolado.”[16] Assim, é evidente a necessidade de se imprimir uma essência ao conhecimento jurídico.
“O filósofo do Direito sente que a lei tem letra e tem espírito.”[17] É esse o conhecimento esperado do jurista, que atinja o “espírito” das leis. Pois “o verdadeiro curso de Direito não é uma simples preparação para o exercício profissional. É uma preparação para a vida.”[18]

5.  CONCLUSÃO

Diante do exposto, resta-nos reafirmar a importância primordial da Filosofia do Direito no processo de construção e reconstrução do Direito, a partir de uma interpretação crítica e aprofundada das normas postas, adentrando no “espírito” das leis; o que só é possível no seu campo de conhecimento, onde o objeto de análise pode ser analisado sob aspectos amplos, considerando-se a universalidade do seu alcance, não bastando ao jurista apenas o conhecimento técnico do ordenamento.


REFERÊNCIAS

ALVES, Alaôr Caffé, et al. O QUE É A FILOSOFIA DO DIREITO? São Paulo: MANOLE. 2004.

BITTAR, Eduardo, C. B., ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de Filosofia do Direito. 8 ed. São Paulo. Atlas. 2010.

SILVA JÚNIOR, Antoniel Souza Ribeiro da. Para que serve isto? A Filosofia do Direito no ensino jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/3935>. Acesso em: 4 mar. 2012.


[1] SILVA JÚNIOR, A. S. R. da. Para que serve isto? A Filosofia do Direito no ensino jurídico. Jus Navigandi, 2012.
[2] Idem.
[3] BITTAR, E.C.B. Et al. Curso de Filosofia do Direito. 8 ed. São Paulo. 2010, p 55.
[4] Idem. p 55.
[5] ALVES, A. C.  As Raízes Sociais da Filosofia do Direito. Uma Visão Crítica. In: O que é a Filosofia do Direito? 5.São Paulo. Manole. 2004.
[6] Idem.
[7] Ibidem.
[8]LAFER, C. Filosofia do Direito e Princípios Gerais: Considerações sobre a Pergunta “O que é a Filosofia do Direito? In: O que é a Filosofia do Direito? 4. Manole. 2004.

[9]BITTAR, E.C.B. Op. cit. p. 09.
[10] Idem. p. 10
[11] ALVES, A. C.  Op. cit.
[12] SILVA JÚNIOR, A. S. R. da. Para que serve isto? A Filosofia do Direito no ensino jurídico. Jus Navigandi,
[13] BITTAR, E.C.B. Et al. Op. cit. p. 12
[14] COMPARATO, F. K. Direito Como Parte Da Ética. In: O que é a Filosofia do Direito? 1. São Paulo. Manole. 2004.
[15] TELLES JÚNIOR, G. da S. Duas Palavras. In: O que é a Filosofia do Direito? 2. São Paulo. Manole. 2004.
[16] COMPARATO, F. K. Op. cit.
[17] TELLES JÚNIOR, G. da S. Op. cit.
[18] COMPARATO, F. K. Op. cit.

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